De que forma a ascensão das mulheres também evidência a fragilidade emocional do homem e a incompreensão do seu papel no mundo de hoje?
Na última década, a ascensão das mulheres em diferentes esferas da sociedade tornou-se mais evidente e impactante. Este período tem sido marcado por avanços significativos nos direitos, oportunidades e representatividade das mulheres, transformando estruturas sociais, políticas e econômicas ao redor do mundo. Vimos um aumento notável na participação política das mulheres. Líderes femininas emergiram em posições de destaque, como Jacinda Ardern na Nova Zelândia, Sanna Marin na Finlândia e Ursula von der Leyen na Comissão Europeia. Essas figuras não apenas desafiaram as normas de gênero, mas também inspiraram novas gerações a se envolverem na política. A representatividade feminina aumentou, promovendo políticas mais inclusivas e equitativas.
No mercado de trabalho, as mulheres também estão conquistando espaços antes inacessíveis. Há um número crescente de mulheres em cargos de liderança corporativa, com empresas reconhecendo os benefícios da diversidade de gênero. Além disso, o empreendedorismo feminino tem prosperado, com mais mulheres fundando e liderando startups inovadoras. Plataformas de financiamento coletivo e programas de mentoria têm sido fundamentais para apoiar essas empreendedoras. Diversas iniciativas têm promovido uma maior conscientização sobre os direitos das mulheres e levado a mudanças significativas em culturas corporativas e legislação. Esse progresso social tem impactado o papel do homem no mundo, promovendo uma verdadeira revisão de conceitos tradicionais de gênero e desafiando estereótipos.
De acordo com o professor americano Scott Gallaway, a ascensão das mulheres, demonstra a importância de reconhecer o poder e a influência crescentes que as mulheres têm conquistado em diversas esferas da sociedade. Ele ressalta que, à medida que mais mulheres ocupam posições de destaque e liderança, ocorre uma mudança significativa na dinâmica de poder e nas estruturas tradicionais de poder. Ele enfatiza a necessidade de valorizar e apoiar a ascensão das mulheres, reconhecendo o impacto positivo que isso pode trazer para a igualdade de gênero e para o progresso igualitário como um todo. Além disso, Gallaway acrescenta que a libertação das mulheres coincide ainda com a dificuldade que os homens estão enfrentando como nunca foi visto antes. A parcela de jovens americanos entre 20 e 24 anos, classificados como ‘nem-nem’, que nem estudam e nem trabalham, triplicou desde os anos de 1980. Para ele, a justificativa é de que os homens normalmente se casam com mulheres em condições socioeconômicas iguais ou inferiores, mas como esse grupo [de mulheres] é cada vez menor em seu país, e os homens estão ficando para tios. É o que ele categoriza como uma “crise de acasalamento”.
Afinal, qual é o papel do homem no mundo contemporâneo?
O ponto de vista dele é um verdadeiro divisor de águas para essa questão. Mas qual á o papel do homem afinal? Existem muitos materiais sobre os processos de mudança e até de libertação do feminino nas mulheres. Isso apoiou e inspira mulheres em diferentes gerações. Contudo, a literatura é relativamente reduzida sobre o processo do masculino. O poeta Robert Bly foi quem cunhou a denominação masculino profundo e foi essa a minha inspiração para começar a estudar e a escrever sobre o assunto há pelo menos 10 anos. Masculino Profundo é um termo que pode ser interpretado de diferentes maneiras, mas frequentemente é utilizado para se referir a uma abordagem mais introspectiva e autêntica da masculinidade. Essa ideia sugere a importância de os homens explorarem suas emoções, vulnerabilidades e conexões mais profundas consigo mesmos e com os outros, em contraste com padrões de masculinidade tradicionais mais superficiais e baseados em estereótipos rígidos. O "masculino profundo" enfatiza a importância do autoconhecimento, da expressão emocional saudável e do cultivo de relacionamentos genuínos, promovendo assim um entendimento mais rico e significativo do que significa ser homem na sociedade contemporânea.
Como os homens permaneceram estagnados e porque suas atitudes são percebidas, às vezes, como machistas e heteronormativas?
O arquétipo masculino descreve os padrões de comportamento, características e qualidades tradicionalmente associados aos homens em diversas culturas. Esses padrões são profundamente enraizados na psique coletiva e influenciam as expectativas e normas sociais sobre como os homens devem se comportar, sentir e se relacionar com o mundo ao seu redor. Alguns homens ficam confusos em relação a sua própria masculinidade de uma forma mais profunda [de como expressá-la]. É como se os homens fossem culpados por tudo que aconteceu no mundo até agora. Como se fossem igualmente os agentes solitários de tudo. Com isso, não se nega a responsabilidade de tudo o que aconteceu e de todos os privilégios que existem pelo fato se ter nascido do sexo masculino. Porém, até isto coloca nos ombros dos homens enormes responsabilidades, sem em muitos casos abrir a eles a possibilidade de dizer claramente que não estão dispostos aceitar mais esses encargos.
Ao pesquisar como se construiu o papel do masculino ao longo do tempo, Allan B. Chinen, autor do livro Além do Herói (1999), foi mostrando que o arquétipo do masculino evoluiu; ou melhor involuiu, a partir do (Caçador- Xamã- Malandro) que guardava uma relação muito próxima entre o lado humano e o lado animal do homem, isto é, a função do arquétipo mais primitivo que era a de caçar e alimentar a comunidade. Com a fixação do homem ao território os homens foram convidados a se transformarem em guerreiros para defender as comunidades, ao passo que as mulheres assumiram o papel de plantar e do preparar os alimentos. Desde este momento até hoje os homens afastaram-se cada vez mais desse papel flexível e provedor do Caçador-Xamã-Malandro e caminharam fortemente na direção de se tornarem guerreiros e patriarcas. Ou seja, adotaram a postura de ‘rei’ ou daquele que é incumbido de cuidar das regras e manter a ferro e fogo a estrutura social. A arqueologia por meio dos contos mostra claramente como esses papéis foram sendo desenvolvidos ao longo da história nas diversas culturas.
Dessa forma, esses arquétipos e essas percepções do papel do masculino e do comportamento do homem são algo que provém de muitas gerações e que para ser transformado pressupõem que se acesse ou que se resgate arquétipos esquecidos e menosprezados ao longo de milhões de anos e que estão vivos no inconsciente coletivo e na própria pele. A partir disso é possível resgatar as qualidades de flexibilidade e de uma percepção melhor do seu papel masculino maduro, capaz de conviver com todos os grupos de igual para igual. A partir dai, aceitar que sim há privilégios que não serão mudados de uma hora para outra, mas sim ao longo do tempo e na medida o mundo também entenda que este arquétipo pode ser transformado. Isso resulta em ganhos como mais harmonia nas relações e removendo dos ombros um grande peso por poder compartilhar e sair desse lugar que de certa forma nos últimos tempos tem sido imposto.
Os homens têm sido encorajados a repensar seu próprio papel e a reconhecer a importância de apoiar e colaborar com as mulheres, promovendo relações mais igualitárias e empoderadoras. Ao invés de enxergar a ascensão das mulheres como uma ameaça, muitos homens têm percebido que a equidade de gênero traz benefícios para todos, gerando um impacto positivo na construção de uma sociedade mais justa e inclusiva. A questão da expressão do homem e da mulher está intrinsecamente ligada aos papéis de gênero socialmente construídos ao longo do tempo. Esses papéis moldam as expectativas de comportamento e expressão de cada gênero na sociedade. Os arquétipos desempenham um papel significativo na forma como homens e mulheres são socializados e expressam suas identidades. Os arquétipos são padrões de comportamento, imagens e símbolos que residem no inconsciente coletivo e influenciam a maneira como percebemos o mundo e a nós mesmos.
Enquanto as mulheres correm com os lobos e exploram a sua natureza mais selvagem, com quem os homens estão correndo?
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Jorge Dornelles de Oliveira
Janeiro de 2025
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